sábado, 30 de maio de 2009

Como vai o nosso Imperador?



Revirando gavetas... Todo família tem as suas lendas. Dentre as lendas da família S., temos a espada acima. Como se pode ver pelo escudo, ela data do Império do Brasil (1822-1889) e, segundo dizem, seria contemporânea à Guerra do Paraguai (1864-1870).
O fato histórico, documentado, é que meu bisavô Joca (Joaquim), quando era major da Força Pública de São Paulo, comandou um batalhão que se internou no atual Mato Grosso do Sul, entre as tropas que tentavam oferecer combate à famosa Coluna Prestes, na década de 1920. Ainda guardo alguns telegramas que ele enviou nesta época e um mapa que traçou à mão.
Pois bem... Agora vem a lenda desta espada. Dizia ele que, em um lugar muito ermo daquela terra esquecida por Deus, encontrou uma fazenda. O dono desta, um homem muito velho, magro, com seu chapéu de palha e espessa barba branca, veio animado falar com ele, logo perguntando:
- Como vai o nosso Imperador?
Meu bisavô, surpreso, explicou-lhe que a Monarquia havia acabado há muito tempo. O velho ficou triste e, mais chateado ainda ficou, ao saber que a escravidão também acabara! Como tocaria agora a sua fazenda?
Apesar das "más" notícias, foi deste homem, isolado do mundo, que o velho Joca ganhou a espada acima.
Para mim, em função do local onde foi encontrada, fica a pergunta: Teria sido ela de um militar da dramática "Retirada da Laguna", imortalizada por Taunay?

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Liberdade é...



- Isto é uma tremenda molecagem! Já é a segunda vez que tento viajar com vocês às 8:30 e vocês cancelam o vôo por falta de teto! Quem não tem competência, não se estabelece!
- A culpa não é da empresa, senhor. São questões climáticas. O Sr. deve ter notado a forte neblina quando chegou – respondeu, educadamente, a atendente da companhia aérea.
Ela detestava o vôo das 8:30 pois, naquela cidade, era comum a ocorrência de densas neblinas pela manhã.
Os passageiros estavam nervosos na fila do check in. As horas seguintes prometiam ser infernais.
O próximo da fila era um homem alto de terno. Seus olhos claros e o cabelo castanho, meio bagunçado, davam-lhe um aspecto de Bill Gates. Ele entregou sua identidade, sem dizer palavra.
- O Sr. Vai para o Rio?
- Isso.
Ela respirou fundo e, tentando se sentir uma máquina insensível, prosseguiu:
- Ocorre que este vôo foi cancelado. Estarei transferindo o Sr. Para o vôo das 12:10.
- Tudo bem! – reagiu ele, com um sorriso que a desconcertou. Ele, sentindo que aquela reação não era a esperada, completou:
- A vida é assim mesmo.
Ele tomou o cartão de embarque, passou entre um grupo de passageiros descontentes e seguiu para a livraria do aeroporto com um semblante satisfeito.
Eram sete e trinta da manhã e ele estava com sono. Mas, pelas próximas horas, sozinho naquele lugar, ele estaria cortado do mundo, inalcançável, sem qualquer responsabilidade ou cobrança, sem acesso à internet e, melhor ainda, podendo colocar a “culpa” por isto na empresa aérea.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Meu dedo na História

Revirando as gavetas, achei finalmente esta foto... da minha adolescência "rebelde". Depois tenho que mandar para a Ada. Sobre este incidente, eu escrevi, há alguns anos:
Um novembro em Paris. Os estudantes secundaristas tomam conta da Cidade Luz. Levantam-se contra o projeto educacional de Jacques Chirac.
Eu estava em uma das colunas de manifestantes que marchavam pela capital. Cursava então a classe de seconde do Liceu François Villon, um estabelecimento público dos menos renomados. Creio que quarenta por cento dos alunos eram filhos de imigrantes pobres de lugares tão díspares quanto o Irã, a China, a Polônia e o Vietnã. Ainda assim, na democracia francesa, poucos ousavam questionar o direito deles tomarem as ruas naquele dia.
Nas manifestações, alguns de nós tinhamos funções especiais. Um grupo com braçadeiras brancas respondia pela segurança, impedindo que agitadores alienígenas se infiltrassem. Naquele dia eu era um balizador (vide foto). Minha missão era interromper o tráfego das ruas transversais para viabilizar o avanço da massa. De repente a coluna se viu diante do presídio de “La Santé”. Lembro-me imprecisamente de um muro alto atrás do qual se via uma grande fachada salpicada de janelas com grades.
Sob a orientação de seus líderes a longa serpente humana interrompeu o passo e começou a gritar:
“La Santé avec nous ! Vos enfants sont concernés !
(La Santé conosco, seus filhos estão envolvidos !)
A fachada sombria, por tantos anos em silêncio, não demorou a responder. De dentro os homens bateram as canecas nas grades e piscaram as luzes de suas celas. Aquela malta enjaulada juntava-se a nós e nós agora a amávamos como se não tivesse mais pecados. Respondera talvez por seus filhos ou talvez pela oportunidade de expressar alguma coisa através daquelas barras de ferro.
Alguns dias depois, na madrugada de 6 de dezembro, a polícia francesa assassinou à golpes de cassetete o estudante Malik Oussekine. Ele nem mesmo fazia parte das manifestações, mas foi confundido com um grupo que fugira da repressão policial. Foi pego tentando entrar em seu edifício e morreu no hall. Número 10 da rua Monsegneur le Prince. Ironicamente, seu nome significa príncipe, em árabe. Rebatizamos então a rua de “Monsegneur le Prince Malik”, a cobrimos com flores e bilhetes de revolta, para depois irmos à porta da prefeitura gritar:
“Malik est mort, assassiné !”
No dia 8 o projeto do governo foi retirado e dois dias depois sepultamos simbolicamente nosso mártir. No peito, por alguns dias, levamos o lema “Plus jamais ça!” E eu, que poucas semanas antes iniciara um curioso romance, já não podia mais ver na bela parisiense algo que pudesse se comparar às emoções da “primavera de novembro”.


quinta-feira, 21 de maio de 2009

O Nome da Coisa



Se quiserem, busquem na internet um nome mais científico. Podem também tentar destruir toda a beleza, atribuindo a uma substância química do cérebro o maravilhoso efeito deste processo. Eu, que o vivi algumas vezes, chamo-o de Euforia.
Em alguns apenas ocorre no amor novo, recém conquistado, quando tudo é novidade. Raros são os casais que a mantém por longos anos. Muito infelizes se tornam aqueles, que, tendo se acostumado com a sensação de Euforia, perdem repentinamente aquela pessoa capaz de produzir o efeito.
Não! Euforia em nada se assemelha ao orgasmo! Orgasmo é coisa banal, tanto que pode ser obtido sozinho. A Euforia pode ser alcançada com um olhar, uma mão na cintura, um toque na nuca. É quando o mundo se apaga, os sons se calam e a alma flutua. Nela se desconhece o perigo e a única urgência está diante de ti, em forma de lábios.
Tive-a, pela primeira vez, muito jovem. Eu ainda um adolescente, ela já uma mulher. Tê-la era algo inimaginável. “Muita areia para o meu caminhão” - eu dizia e, por isto, nem tentava. Foi a iniciativa de uma amiga que me abriu os olhos para o fato de que o desafio não era impossível. Convidei-a para me acompanhar em um baile de formatura...
A grande Euforia que eu guardo daquela noite não foi o primeiro beijo. Foi, sim, quando ainda estávamos no banco de trás do carro e eu (muito timidamente) segurei sua mão. Ela nada disse. Apenas entrelaçou seus dedos aos meus e, ali, tive a certeza de que ela era minha.
O casamento tem coisas maravilhosas. Recomendo aos homens, depois dos trinta. Companheirismo, cumplicidade, transmissão de pensamento, amor. Mas, certamente, não é o terreno fértil para a Euforia. Aliás, acho que não há terreno que baste para ela. A Euforia é uma planta nômade.

[O quadro é de Gustav Klimt - "O Beijo" - um dos meus pintores preferidos]



quarta-feira, 20 de maio de 2009

A Primeira Lei do Amor


Era assim tão ciumenta?

Há muitos anos, no primeiro período do amor dos dois, incontestavelmente, era. Só que os anos passaram e o que ela vive hoje como ciúme não é sem dúvida mais do que um hábito.

Digamos as coisas de outra maneira: toda relação amorosa repousa sobre convenções não escritas que aqueles que se amam estabelecem precipitadamente nas primeiras semanas de amor. Eles ainda estão numa espécie de sonho, mas ao mesmo tempo, sem sabê-lo, redigem como juristas rigorosos as cláusulas detalhadas de seu contrato. Oh, amantes, sejam prudentes nesses perigosos primeiros dias! Se você levar para o outro café da manhã na cama, vai ter que levá-lo para sempre, se não quiser ser acusado de desamor e traição.


(Milan Kundera - O Livro do Riso e do Esquecimento - pág.45 - Editora Nova Fronteira, 1987)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Para 2009: "kto żyw na konia siadał"

XXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXX XXXXXXXX XXXXXXXX "Quem estiver vivo, que monte seu cavalo!" Esta frase cruzou a Polônia em 1656, quando do terrível "Dilúvio" (a devastadora invasão do país pelos suecos). Era o início de uma grande reação.
Com esta frase eu comecei o ano de 2009, decidido a mudar a minha vida. Daí para frente, tirei a poeira do corpo, mudei de trabalho, de casa, de cidade.
Deixar o meu velho mundo foi mais fácil do que pensei. Claro que continuo apaixonado pelo Rio de Janeiro... Botafogo, Urca e o instigante Centro da cidade. Mas eu precisava de paz, de tempo e de um trabalho que me desafiasse positivamente.
Durante este processo, reencontrei muitas coisas perdidas, velhos personagens saltaram da minha memória e fui assolado por recordações de tempos distantes. E o futuro... Serei capaz de controlá-lo????
Esta é a jornada que começo a contar aqui, do meu jeito.