sábado, 30 de maio de 2009
Como vai o nosso Imperador?
sexta-feira, 29 de maio de 2009
Liberdade é...
- A culpa não é da empresa, senhor. São questões climáticas. O Sr. deve ter notado a forte neblina quando chegou – respondeu, educadamente, a atendente da companhia aérea.
Ela detestava o vôo das 8:30 pois, naquela cidade, era comum a ocorrência de densas neblinas pela manhã.
Os passageiros estavam nervosos na fila do check in. As horas seguintes prometiam ser infernais.
O próximo da fila era um homem alto de terno. Seus olhos claros e o cabelo castanho, meio bagunçado, davam-lhe um aspecto de Bill Gates. Ele entregou sua identidade, sem dizer palavra.
- O Sr. Vai para o Rio?
- Isso.
Ela respirou fundo e, tentando se sentir uma máquina insensível, prosseguiu:
- Ocorre que este vôo foi cancelado. Estarei transferindo o Sr. Para o vôo das 12:10.
- Tudo bem! – reagiu ele, com um sorriso que a desconcertou. Ele, sentindo que aquela reação não era a esperada, completou:
- A vida é assim mesmo.
Ele tomou o cartão de embarque, passou entre um grupo de passageiros descontentes e seguiu para a livraria do aeroporto com um semblante satisfeito.
Eram sete e trinta da manhã e ele estava com sono. Mas, pelas próximas horas, sozinho naquele lugar, ele estaria cortado do mundo, inalcançável, sem qualquer responsabilidade ou cobrança, sem acesso à internet e, melhor ainda, podendo colocar a “culpa” por isto na empresa aérea.
sexta-feira, 22 de maio de 2009
Meu dedo na História
Eu estava em uma das colunas de manifestantes que marchavam pela capital. Cursava então a classe de seconde do Liceu François Villon, um estabelecimento público dos menos renomados. Creio que quarenta por cento dos alunos eram filhos de imigrantes pobres de lugares tão díspares quanto o Irã, a China, a Polônia e o Vietnã. Ainda assim, na democracia francesa, poucos ousavam questionar o direito deles tomarem as ruas naquele dia.
Nas manifestações, alguns de nós tinhamos funções especiais. Um grupo com braçadeiras brancas respondia pela segurança, impedindo que agitadores alienígenas se infiltrassem. Naquele dia eu era um balizador (vide foto). Minha missão era interromper o tráfego das ruas transversais para viabilizar o avanço da massa. De repente a coluna se viu diante do presídio de “La Santé”. Lembro-me imprecisamente de um muro alto atrás do qual se via uma grande fachada salpicada de janelas com grades.
Sob a orientação de seus líderes a longa serpente humana interrompeu o passo e começou a gritar:
“La Santé avec nous ! Vos enfants sont concernés !
(La Santé conosco, seus filhos estão envolvidos !)
A fachada sombria, por tantos anos em silêncio, não demorou a responder. De dentro os homens bateram as canecas nas grades e piscaram as luzes de suas celas. Aquela malta enjaulada juntava-se a nós e nós agora a amávamos como se não tivesse mais pecados. Respondera talvez por seus filhos ou talvez pela oportunidade de expressar alguma coisa através daquelas barras de ferro.
Alguns dias depois, na madrugada de 6 de dezembro, a polícia francesa assassinou à golpes de cassetete o estudante Malik Oussekine. Ele nem mesmo fazia parte das manifestações, mas foi confundido com um grupo que fugira da repressão policial. Foi pego tentando entrar em seu edifício e morreu no hall. Número 10 da rua Monsegneur le Prince. Ironicamente, seu nome significa príncipe, em árabe. Rebatizamos então a rua de “Monsegneur le Prince Malik”, a cobrimos com flores e bilhetes de revolta, para depois irmos à porta da prefeitura gritar:
“Malik est mort, assassiné !”
No dia 8 o projeto do governo foi retirado e dois dias depois sepultamos simbolicamente nosso mártir. No peito, por alguns dias, levamos o lema “Plus jamais ça!” E eu, que poucas semanas antes iniciara um curioso romance, já não podia mais ver na bela parisiense algo que pudesse se comparar às emoções da “primavera de novembro”.
quinta-feira, 21 de maio de 2009
O Nome da Coisa
Se quiserem, busquem na internet um nome mais científico. Podem também tentar destruir toda a beleza, atribuindo a uma substância química do cérebro o maravilhoso efeito deste processo. Eu, que o vivi algumas vezes, chamo-o de Euforia.
Em alguns apenas ocorre no amor novo, recém conquistado, quando tudo é novidade. Raros são os casais que a mantém por longos anos. Muito infelizes se tornam aqueles, que, tendo se acostumado com a sensação de Euforia, perdem repentinamente aquela pessoa capaz de produzir o efeito.
Não! Euforia em nada se assemelha ao orgasmo! Orgasmo é coisa banal, tanto que pode ser obtido sozinho. A Euforia pode ser alcançada com um olhar, uma mão na cintura, um toque na nuca. É quando o mundo se apaga, os sons se calam e a alma flutua. Nela se desconhece o perigo e a única urgência está diante de ti, em forma de lábios.
Tive-a, pela primeira vez, muito jovem. Eu ainda um adolescente, ela já uma mulher. Tê-la era algo inimaginável. “Muita areia para o meu caminhão” - eu dizia e, por isto, nem tentava. Foi a iniciativa de uma amiga que me abriu os olhos para o fato de que o desafio não era impossível. Convidei-a para me acompanhar em um baile de formatura...
A grande Euforia que eu guardo daquela noite não foi o primeiro beijo. Foi, sim, quando ainda estávamos no banco de trás do carro e eu (muito timidamente) segurei sua mão. Ela nada disse. Apenas entrelaçou seus dedos aos meus e, ali, tive a certeza de que ela era minha.
O casamento tem coisas maravilhosas. Recomendo aos homens, depois dos trinta. Companheirismo, cumplicidade, transmissão de pensamento, amor. Mas, certamente, não é o terreno fértil para a Euforia. Aliás, acho que não há terreno que baste para ela. A Euforia é uma planta nômade.
[O quadro é de Gustav Klimt - "O Beijo" - um dos meus pintores preferidos]