sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Natal Azedo


Vou te contar um segredo: eu não gosto do Natal. É uma data que, por si só, me deixa deprimido. Seria legal ver a família toda reunida, como ontem. Meus pais vivinhos, meus irmãos, esposa, cunhada, minhas filhas e todos os sobrinhos. Tão raro vê-los todos juntos! Mas não gosto de participar disto. Queria poder ver de longe, como quem assiste um filme. Acho que são muitas expectativas das crianças, muita voracidade alimentar de alguns adultos, muita ansiedade das cozinheiras da família (em busca da justa aprovação), além da escolha das roupas, dos penteados das crianças, dos vestidinhos que resolvem não caber no último instante... Parece aqueles filmes embolados de baixo orçamento, em que o câmera vai andando pela sala apertada, fazendo a imagem tremer. Ouve-se conversas pela metade, flagra-se pessoas fazendo comentários cruéis, às vezes contra você...


Tudo isto, que acontece todos os anos, já tinha sido suficiente para eu me jogar de roupa na cama, duas horas antes da ceia, e torcer para ser esquecido ali. Mas, para dar à noite um toque inesquecível, resolveu meu pai dar um esporro monumental na minha filha mais velha, na hora em tudo já se apagava. Um esporro daqueles que eu, até os 12 anos, levava uma vez por semana. Alto, berrado, desproporcional ao "crime" cometido, humilhante. O tipo de "souvenir" que ninguém quer levar de uma noite de Natal. Não culpo tanto o velho, como não posso culpar um urso de circo que um dia resolve se lembrar que é um urso e devora alguém da platéia. Ele agiu segundo a sua natureza. Eu o amo profundamente e passamos maravilhosos momentos nos últimos anos. Sei que ele estava cansado, com sono, tinha comido muito mais do que a sua diabetes recomenda. Mas foi, realmente, muito triste para mim e para minha esposa vermos nossa filha ser humilhada na noite do amor, da família e da fraternidade.
Não vou brigar com o meu velho, mas hoje pretendo ficar aqui no meu canto, longe do enterro dos ossos, longe do “espírito natalino”.
É isto...

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Ecologista Radical

Eu estou ficando um especialista em cocôs, tanto quanto ao cheiro e à "cara" deles. É que minha filha caçula, que tem seis anos e é extremamente teimosa, resolver salvar a água do planeta economizando descargas!

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Novo mundo, novos hábitos


Quando o José me viu, na sala dos professores, colocou a mão para trás e disse:

- Desculpe se não te cumprimento, Marcos. É que minha mão está suja de giz.

- Que é isso, Zé! Em época de gripe suína, é melhor deixar a mão no bolso.

Ele ficou levemente constrangido ao se ver pego na "mentira" e defendeu-se:

- É que eu tenho criança pequena em casa...


Então é isto. Oferecer a mão a um amigo, em tempos de pandemia, virou um ato deselegante. É como apontar uma arma. Aqui em Curitiba, onde mais de trinta já morreram, justifica-se. Espirrar, então, é coisa que merece o maior repúdio. "Vá espirrar na PQP" - parecem dizer os olhares de reprovação.

Janelas abertas, por favor! Ainda que a corrente de ar gelado possa te matar de outra coisa.

Na faculdade, assiste-se ao ato quase religioso de, na passagem pelo bebedouro, apertar a caixinha com alcool gel, como quem mergulha os dedos em uma água benta antes do combate.

Pessoas mascaradas andam pelas ruas, sem qualquer constrangimento, enquanto os Shoopings Centers vivem às moscas.

Quem quer ir ao cinema?

Deixei as balas perdidas do Rio de Janeiro, para viver na pacata Curitiba outro "jogo", outra loteria. A loteria (sem maudade) dos perdigotos.

Espero poder rir disto tudo no próximo verão. Mas, para dezenas, o mundo já acabou.

domingo, 12 de julho de 2009

Uma "arte" rimada da turma de 1936


Um caderno de capa dura, da papelaria "Casa Mattos", guarda, com letras bem desenhadas, as poesias da turma 5º ano A do Colégio Pedro II, de 1936. Tem para todos os gostos !!! Mas apreciei muito esta daí... fazendo graça de um certo professor Pereira que, pelo jeito, era gorducho e vaidoso.
Por ser, talvez, o mais chato dos mestres, ficou imortalizado pela criatividade dos alunos.
Onde quer que esteja hoje, que a terra lhe seja leve!!!

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Rousseau Ensina



Em vão nos proíbem isto ou aquilo, porque nunca o remorso reprova com energia o que a natureza bem ordenada consente, e, com mais razão, o que prescreve. Oh, meu rapaz, não contraries nunca os teus sentidos: deixa-te viver nesse feliz estado em que a vida é inocente. Lembra-te que mais ofendemos a natureza evitando-a que combatendo-a; aprendamos, primeiro, a resistir, para saber, depois, quando devemos ceder sem culpa” (apud "Emile" de Rousseau)

terça-feira, 9 de junho de 2009

Uma Questão Delicada



Ontem, por falta do que fazer, fui assistir um filme italiano chamado "O Último Beijo" ( L'Ultimo Bacio ). No final das contas, tive uma boa surpresa.
O filme pode ser visto pelo seu ângulo masculino ou feminino e tem interessantes histórias paralelas. Mas o que quero mesmo é salientar o conflito interno de Carlo ( Stefano Accorsi ).

Carlo namora e vive com Giulia ( Giovanna Mezzogiorno ) há cerca de três anos. Ela é uma moça alegre, simpática e que nutre uma paixão saudável por ele. O filme se esforça para não mostrar qualquer defeito dela, o que torna a questão mais interessante.

Pois bem... Giulia, inesperadamente, fica grávida. Imensamente feliz, ela corre para compartilhar esta bela novidade com toda a família. É um sonho que se torna realidade.
Diz a lógica que Carlo também deve demonstrar grande alegria, certo? Afinal, ele a ama e eles são felizes juntos. Então, ele tenta ficar feliz, ele tenta sentir e transmitir esta "felicidade".
Ocorre que homens e mulheres são diferentes! Mesmo amando Giulia, ele tem o direito de não ficar saltitante com esta gravidez não programada.

Muitos homens sonham em ter filhos e ele provavelmente não é exceção. Mas nossos hormônios, nossos instintos, não fazem disto a razão de nossas vidas. Nem entramos em parafuso aos 30 anos se a cegonha deixa de bater na nossa porta.
Então, é natural que Carlo reflita e tenha reações ambíguas, como uma mudança que traz também aspectos negativos. Em suma, é seu direito ficar deprimido. E ele fica. E ele tenta se sentir jovem novamente... e ele troca os pés pelas mãos!!!
Bobamente, envolve-se com uma ninfeta de 18 aninhos e... Não vou contar. Vejam o filme.

O que quero, apenas, é fazer uma advertência às mulheres (mesmo sabendo que serei apedrejado). Se o seu namorado não está pulando de alegria porque você, acidentalmente, ficou grávida, isto não significa (necessariamente) falta de amor. Não faça ele se sentir culpado por estar confuso, perplexo. Tente imaginar que ele, provavelmente, tinha outros planos para a vida. É claro que o bebê não foi gerado por partenogênese (ou pelo “Divino Espírito Santo”), mas tente ter um pouco de sensibilidade. Para ele também será um grande desafio.

sábado, 30 de maio de 2009

Como vai o nosso Imperador?



Revirando gavetas... Todo família tem as suas lendas. Dentre as lendas da família S., temos a espada acima. Como se pode ver pelo escudo, ela data do Império do Brasil (1822-1889) e, segundo dizem, seria contemporânea à Guerra do Paraguai (1864-1870).
O fato histórico, documentado, é que meu bisavô Joca (Joaquim), quando era major da Força Pública de São Paulo, comandou um batalhão que se internou no atual Mato Grosso do Sul, entre as tropas que tentavam oferecer combate à famosa Coluna Prestes, na década de 1920. Ainda guardo alguns telegramas que ele enviou nesta época e um mapa que traçou à mão.
Pois bem... Agora vem a lenda desta espada. Dizia ele que, em um lugar muito ermo daquela terra esquecida por Deus, encontrou uma fazenda. O dono desta, um homem muito velho, magro, com seu chapéu de palha e espessa barba branca, veio animado falar com ele, logo perguntando:
- Como vai o nosso Imperador?
Meu bisavô, surpreso, explicou-lhe que a Monarquia havia acabado há muito tempo. O velho ficou triste e, mais chateado ainda ficou, ao saber que a escravidão também acabara! Como tocaria agora a sua fazenda?
Apesar das "más" notícias, foi deste homem, isolado do mundo, que o velho Joca ganhou a espada acima.
Para mim, em função do local onde foi encontrada, fica a pergunta: Teria sido ela de um militar da dramática "Retirada da Laguna", imortalizada por Taunay?

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Liberdade é...



- Isto é uma tremenda molecagem! Já é a segunda vez que tento viajar com vocês às 8:30 e vocês cancelam o vôo por falta de teto! Quem não tem competência, não se estabelece!
- A culpa não é da empresa, senhor. São questões climáticas. O Sr. deve ter notado a forte neblina quando chegou – respondeu, educadamente, a atendente da companhia aérea.
Ela detestava o vôo das 8:30 pois, naquela cidade, era comum a ocorrência de densas neblinas pela manhã.
Os passageiros estavam nervosos na fila do check in. As horas seguintes prometiam ser infernais.
O próximo da fila era um homem alto de terno. Seus olhos claros e o cabelo castanho, meio bagunçado, davam-lhe um aspecto de Bill Gates. Ele entregou sua identidade, sem dizer palavra.
- O Sr. Vai para o Rio?
- Isso.
Ela respirou fundo e, tentando se sentir uma máquina insensível, prosseguiu:
- Ocorre que este vôo foi cancelado. Estarei transferindo o Sr. Para o vôo das 12:10.
- Tudo bem! – reagiu ele, com um sorriso que a desconcertou. Ele, sentindo que aquela reação não era a esperada, completou:
- A vida é assim mesmo.
Ele tomou o cartão de embarque, passou entre um grupo de passageiros descontentes e seguiu para a livraria do aeroporto com um semblante satisfeito.
Eram sete e trinta da manhã e ele estava com sono. Mas, pelas próximas horas, sozinho naquele lugar, ele estaria cortado do mundo, inalcançável, sem qualquer responsabilidade ou cobrança, sem acesso à internet e, melhor ainda, podendo colocar a “culpa” por isto na empresa aérea.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Meu dedo na História

Revirando as gavetas, achei finalmente esta foto... da minha adolescência "rebelde". Depois tenho que mandar para a Ada. Sobre este incidente, eu escrevi, há alguns anos:
Um novembro em Paris. Os estudantes secundaristas tomam conta da Cidade Luz. Levantam-se contra o projeto educacional de Jacques Chirac.
Eu estava em uma das colunas de manifestantes que marchavam pela capital. Cursava então a classe de seconde do Liceu François Villon, um estabelecimento público dos menos renomados. Creio que quarenta por cento dos alunos eram filhos de imigrantes pobres de lugares tão díspares quanto o Irã, a China, a Polônia e o Vietnã. Ainda assim, na democracia francesa, poucos ousavam questionar o direito deles tomarem as ruas naquele dia.
Nas manifestações, alguns de nós tinhamos funções especiais. Um grupo com braçadeiras brancas respondia pela segurança, impedindo que agitadores alienígenas se infiltrassem. Naquele dia eu era um balizador (vide foto). Minha missão era interromper o tráfego das ruas transversais para viabilizar o avanço da massa. De repente a coluna se viu diante do presídio de “La Santé”. Lembro-me imprecisamente de um muro alto atrás do qual se via uma grande fachada salpicada de janelas com grades.
Sob a orientação de seus líderes a longa serpente humana interrompeu o passo e começou a gritar:
“La Santé avec nous ! Vos enfants sont concernés !
(La Santé conosco, seus filhos estão envolvidos !)
A fachada sombria, por tantos anos em silêncio, não demorou a responder. De dentro os homens bateram as canecas nas grades e piscaram as luzes de suas celas. Aquela malta enjaulada juntava-se a nós e nós agora a amávamos como se não tivesse mais pecados. Respondera talvez por seus filhos ou talvez pela oportunidade de expressar alguma coisa através daquelas barras de ferro.
Alguns dias depois, na madrugada de 6 de dezembro, a polícia francesa assassinou à golpes de cassetete o estudante Malik Oussekine. Ele nem mesmo fazia parte das manifestações, mas foi confundido com um grupo que fugira da repressão policial. Foi pego tentando entrar em seu edifício e morreu no hall. Número 10 da rua Monsegneur le Prince. Ironicamente, seu nome significa príncipe, em árabe. Rebatizamos então a rua de “Monsegneur le Prince Malik”, a cobrimos com flores e bilhetes de revolta, para depois irmos à porta da prefeitura gritar:
“Malik est mort, assassiné !”
No dia 8 o projeto do governo foi retirado e dois dias depois sepultamos simbolicamente nosso mártir. No peito, por alguns dias, levamos o lema “Plus jamais ça!” E eu, que poucas semanas antes iniciara um curioso romance, já não podia mais ver na bela parisiense algo que pudesse se comparar às emoções da “primavera de novembro”.


quinta-feira, 21 de maio de 2009

O Nome da Coisa



Se quiserem, busquem na internet um nome mais científico. Podem também tentar destruir toda a beleza, atribuindo a uma substância química do cérebro o maravilhoso efeito deste processo. Eu, que o vivi algumas vezes, chamo-o de Euforia.
Em alguns apenas ocorre no amor novo, recém conquistado, quando tudo é novidade. Raros são os casais que a mantém por longos anos. Muito infelizes se tornam aqueles, que, tendo se acostumado com a sensação de Euforia, perdem repentinamente aquela pessoa capaz de produzir o efeito.
Não! Euforia em nada se assemelha ao orgasmo! Orgasmo é coisa banal, tanto que pode ser obtido sozinho. A Euforia pode ser alcançada com um olhar, uma mão na cintura, um toque na nuca. É quando o mundo se apaga, os sons se calam e a alma flutua. Nela se desconhece o perigo e a única urgência está diante de ti, em forma de lábios.
Tive-a, pela primeira vez, muito jovem. Eu ainda um adolescente, ela já uma mulher. Tê-la era algo inimaginável. “Muita areia para o meu caminhão” - eu dizia e, por isto, nem tentava. Foi a iniciativa de uma amiga que me abriu os olhos para o fato de que o desafio não era impossível. Convidei-a para me acompanhar em um baile de formatura...
A grande Euforia que eu guardo daquela noite não foi o primeiro beijo. Foi, sim, quando ainda estávamos no banco de trás do carro e eu (muito timidamente) segurei sua mão. Ela nada disse. Apenas entrelaçou seus dedos aos meus e, ali, tive a certeza de que ela era minha.
O casamento tem coisas maravilhosas. Recomendo aos homens, depois dos trinta. Companheirismo, cumplicidade, transmissão de pensamento, amor. Mas, certamente, não é o terreno fértil para a Euforia. Aliás, acho que não há terreno que baste para ela. A Euforia é uma planta nômade.

[O quadro é de Gustav Klimt - "O Beijo" - um dos meus pintores preferidos]



quarta-feira, 20 de maio de 2009

A Primeira Lei do Amor


Era assim tão ciumenta?

Há muitos anos, no primeiro período do amor dos dois, incontestavelmente, era. Só que os anos passaram e o que ela vive hoje como ciúme não é sem dúvida mais do que um hábito.

Digamos as coisas de outra maneira: toda relação amorosa repousa sobre convenções não escritas que aqueles que se amam estabelecem precipitadamente nas primeiras semanas de amor. Eles ainda estão numa espécie de sonho, mas ao mesmo tempo, sem sabê-lo, redigem como juristas rigorosos as cláusulas detalhadas de seu contrato. Oh, amantes, sejam prudentes nesses perigosos primeiros dias! Se você levar para o outro café da manhã na cama, vai ter que levá-lo para sempre, se não quiser ser acusado de desamor e traição.


(Milan Kundera - O Livro do Riso e do Esquecimento - pág.45 - Editora Nova Fronteira, 1987)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Para 2009: "kto żyw na konia siadał"

XXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXX XXXXXXXX XXXXXXXX "Quem estiver vivo, que monte seu cavalo!" Esta frase cruzou a Polônia em 1656, quando do terrível "Dilúvio" (a devastadora invasão do país pelos suecos). Era o início de uma grande reação.
Com esta frase eu comecei o ano de 2009, decidido a mudar a minha vida. Daí para frente, tirei a poeira do corpo, mudei de trabalho, de casa, de cidade.
Deixar o meu velho mundo foi mais fácil do que pensei. Claro que continuo apaixonado pelo Rio de Janeiro... Botafogo, Urca e o instigante Centro da cidade. Mas eu precisava de paz, de tempo e de um trabalho que me desafiasse positivamente.
Durante este processo, reencontrei muitas coisas perdidas, velhos personagens saltaram da minha memória e fui assolado por recordações de tempos distantes. E o futuro... Serei capaz de controlá-lo????
Esta é a jornada que começo a contar aqui, do meu jeito.